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domingo, 3 de abril de 2011

Grandes bancos dos EUA lavaram dinheiro do narcotráfico

Carta Maior - [David Brooks] Alguns dos principais bancos e financeiras estadunidenses, entre eles Wells Fargo, Bank of América, Citigroup, American Express e Western Union lucraram durante anos com a lavagem de dinheiro oriundo do narcotráfico e só pagam multas mínimas, sem que nenhum executivo seja encarcerado quando as autoridades conseguem detectar o negócio ilícito.

Em múltiplos casos fiscalizados durante os últimos anos, estes bancos estadunidenses confessaram não ter cumprido as leis e regulamentos federais para controlar a lavagem de dinheiro, ao participarem das transferências de bilhões de dólares em fundos ilícitos provenientes do narcotráfico mexicano.
Esse é o caso do Wachovia Corp, antes o sexto banco do país, comprado pelo Wells Fargo em 2008 e agora o banco com mais sucursais nos Estados Unidos. O Wells Fargo admitiu perante um tribunal que o Wachovia não vigiou nem informou sobre as atividades suspeitas de lavagem de dinheiro por narcotraficantes, incluindo quantias para a compra de pelo menos quatro aviões nos Estados Unidos, que transportaram um total de 22 toneladas de cocaína. O outro banco envolvido na transferência de fundos com os quais se comprou um desses aviões – um DC-9 que em seguida foi confiscado no México com toneladas de cocaína – foi o Bank of America, reportou o Bloomberg News.

Tudo isso foi revelado num acordo judicial do banco com procuradores federais, em março de 2010. Nos documentos judiciais do caso lidos pelo La Jornada, Wachovia admitiu que não fez o suficiente para detectar fundos ilícitos sob sua administração, na casa de mais de 378,4 bilhões de dólares, em seus negócios com casas de câmbio mexicanas, entre maio de 2004 e maio de 2007.

Desse total, Wachovia processou ao menos 373,6 bilhões em transferências eletrônicas, mais 4,7 bilhões em traslados de dinheiro em espécie e outros 47 bilhões em depósitos de cheques internacionais. Nem todos esses fundos estão vinculados ao narcotráfico, mas segundo as investigações do Departamento de Justiça bilhões não foram sujeitos à fiscalização exigida pela lei, e centenas de bilhões de dólares desses fundos estavam diretamente ligados ao narcotráfico.

Wachovia, violação recorde

Pelo volume total de fundos que não estiveram sujeitos à fiscalização antilavagem de dinheiro, o caso do Wachovia se tornou a maior violação da Lei de Sigilo Bancário na história. Essa lei obriga os bancos a reportarem às autoridades toda transferência de fundos em espécie em valores acima de 10 mil dólares, assim como a informar sobre atividade suspeita de lavagem de dinheiro.

O procurador federal no caso, Jeffrey Sloman, declarou em março, ao anunciar o acordo com Wells Fargo: "A desatenção flagrante de nossas leis bancárias por Wachovia permitiu uma virtual carta branca aos cartéis internacionais de cocaína para financiar suas operações, ao lavarem ao menos 110 milhões de dólares em lucros com a droga".

Não é que ninguém tenha notado. O próprio banco admitiu perante o Tribunal que já desde 2004 o Wachovia reconheceu o risco. Mas apesar das advertências permaneceu no negócio, segundo os documentos lidos por La Jornada.

Esse negócio era a administração e traslado de fundos de pelo menos 22 casas de câmbio no México que tinham contas no Wachovia. Um exemplo citado nos documentos é o da Casa de Câmbio Puebla S/A, cujos gerentes criaram empresas fictícias para os cartéis e, segundo o Departamento de Justiça, conseguiram lavar uns 720 milhões de dólares, por meio de bancos estadunidenses.

De fato, foi o caso da Casa de Câmbio Puebla que detonou esta investigação das autoridades federais. Desde 2005 algunas transferências de fundos do Wachovia já estavam sob investigação, em suas sucursais em Miami, a partir do México, por meio de casas de câmbio, e estes fundos eram utilizados para comprar aviões destinados ao narcotráfico, informam os documentos judiciais do caso.

Por outro lado, durante esse período o diretor da unidade antilavagem de dinheiro de Wachovia em Londres, Martin Woods, suspeitava que narcotraficantes utilizavam o banco para mover quantias. Ele informou a seus chefes, que lhe ordenaram a deixar o assunto de lado, e por isso renunciou ao seu postos reportou a Bloomberg. Woods disse a essa agência que "é a lavagem de dinheiro dos cartéis pelos bancos que financia a tragédia...Se não se vê a correlação entre a lavagem de dinheiro pelos bancos e as 22 mil pessoas assassinadas no México não se entende o que está em jogo".

Depois de ser acusado de violar a lei, Wells Fargo, agora dono do Wachovia, comprometeu-se num tribunal federal de Miami a reformar seus sistemas de vigilância. Pagou 160 milhões de dólares em multa e, caso cumpra suas promessas feitas às autoridades federais, estas deixarão os encargos contra o banco em março de 2011.

Esta prática é comum nestes casos e se chama acordo de fiscalização diferida. Por meio dele um banco paga uma multa, coopera com a investigação e se compromete a não violar a lei, mais.
Nenhum empregado recusou a propina  Em 20 escritórios diferentes do Western Union, nenhum empregado jamais recusou a propina para permitirem envios de quantias atribuídas a laranjas.
Calcula-se que quase 30 bilhões de dólares em dinheiro vivo se mova de um lado a outro da fronteira mexicana com os Estados Unidos. E uma parte desses recursos é depositada em bancos de ambos os países e em bancos internacionais, a partir dos quais os fundos podem ser trasladados por todo o sistema financeiro internacional.

FONTE: http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=14083:grandes-bancos-dos-eua-lavaram-dinheiro-do-narcotrafico&catid=89:laboraleconomia&Itemid=99&sms_ss=twitter&at_xt=4d98d088ac1b6aed,0
Tradução: Katarina Peixoto

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A surda guerra oculta, por Chico de Oliveira

A celebração quase unânime do assalto das forças estatais aos morros da Vila Cruzeiro e Complexo do Alemão revela mais de nossa sociedade, dos impasses da política e do exercício do poder do que as firulas do PMDB e o negaceio do PT em torno da formação do governo da presidente Dilma.
Sob o mantra do combate ao crime organizado, o que se oculta é uma surda guerra de classes na outrora charmosa e agora ultraperigosa Cidade Maravilhosa. Essa guerra explode de tempos em tempos nos "bondes" (o termo é aplicado aos bandidos) das forças repressivas, levantando apenas a ponta do iceberg. Na verdade, nossa cidade mais bonita, ao lado de Salvador, que fazia os encantos dos brasileiros nas décadas de 40 e 50 do século passado, não resistiu à emergência da pobreza rude e sem eufemismos, como aqueles que cantava Sílvio Caldas em seu Favela.
Por mais maquiagem que as teles imprimam aos seus jornais, mesmo os mais realistas, como o do senhor Datena na Band, o desfile que se vê é menos o das tropas que no resto do ano não têm o que fazer, salvo patrulhar o Haiti, que é um Rio mais pobre e menos charmoso, e mais o de pessoas pobres, na maior parte das vezes pobremente vestidas ou pelo menos decentemente pobres, cujo calçado não passa de uma sandália havaiana falsificada. Por trás das câmaras, o rancor surdo das outras classes sociais, e sem pieguice, a resistência feroz, que se transforma periodicamente em ataques ainda mais ferozes, de uma parcela dos pobres que se transformou em traficantes, já que a civilização capitalista brasileira não lhes oferece outros meios de sobrevivência.
                                        
O aplauso de vastas porções da população do Rio apenas confirma que se trata de um ódio rancoroso; e, se enquetes forem realizadas em outras cidades, não tardará a aparecer um clamor público, já insinuado pelas autoridades, para que a façanha criminosa do Estado no Rio seja replicada em outros lugares do nosso País. A população viu, agora ao vivo e em cores, o reality show do Capitão Nascimento subindo o morro com o Bope; aliás, os que vivem nas favelas já se acostumaram a isso. Desta vez a vida ganhou da arte: mesmo o Tropa de Elite 2, cujos mais de 10 milhões de espectadores atestam o fascismo no ar, perdeu feio para a violência estatal em nome da lei. Se no capítulo da economia o capitalismo periférico açulado até a exasperação pelo governo Lula mal consegue se manter dentro dos limites da lei - porque a regra é enriquecer às custas do fundo público de qualquer maneira -, no capítulo da violência esperava-se apenas um evento mais provocador para soltar os cães da repressão sem nenhuma homenagem do vicio à virtude. O episódio mais antigo do PCC em São Paulo já havia quase provocado essa explosão de alegria do ódio reprimido.
Agora, o Rio deixou à solta os cães de aluguel. Ninguém se engane: por trás das fachadas engalanadas do Brasil do futuro que já chegou nas prateleiras das Casas Bahia, vive uma sociedade esgarçada, forçada a correr atrás do êxito a qualquer preço, liquidando sem juros qualquer valor civilizatório, que a muito custo conseguimos erguer depois da barbárie da ditadura militar.
Nenhum cientista social conseguiria ser mais contundente e mais preciso para diagnosticar a sociedade brasileira que essa crise apenas localizada no Rio. Está nas livrarias Hitler, do historiador britânico Ian Kershaw. Qualquer semelhança das brigadas que percorriam as ruas de Munique nos anos 20 com a subida aos morros e a reação dos traficantes no Rio não é coincidência: no ar, esse sentimento de insegurança, parente próximo do fascismo, rapidamente acende o rastilho de pólvora das relações de mercado não mercantilizadas, que são a raiz da pobreza no Brasil, e se transforma na violência mais desenfreada. A situação brasileira, de que o Rio é o emblema, pelos aplausos generalizados, pelos milhões de espectadores do Tropa de Elite 2, e no fim, mas não menos importante, pela presteza da Marinha em atender ao pedido do governo do Rio, parece que pede um ditador com punho de ferro. Felizmente, por ora, não tem nenhum candidato, não saímos de uma derrota militar severa, não derrubamos uma velha monarquia, nem há uma Grande Depressão. Há uma satisfação tola no ar: já realizamos a sexta eleição direta para presidente da República e estamos consolidando a democracia. Estamos? Não há "titio Adolf" à vista, mas não provoquemos a história; ela costuma responder à violência com violência.
Francisco de Oliveira é professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

FONTE: http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,a-surda-guerra-oculta,649417,0.htm

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O tráfico no Rio e o crime organizado transnacional


Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. A situação que vemos no hoje no Rio, diz o jurista Wálter Maierovitch, reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. "É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades", defende.

Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. Esses são os grandes responsáveis pela violência e pelo tráfico de drogas e armas em todo o mundo. A situação que vemos no hoje no Rio reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades. A avaliação é do jurista Wálter Maeirovitch, colunista da revista Carta Capital e ex-secretário nacional antidrogas da Presidência da República.

Compreender essa dimensão global é condição necessária para evitar discursos e propostas de soluções simplistas para o problema. Maierovitch dá um exemplo: “Os produtos principais do tráfico de drogas são a maconha e a cocaína. Tomemos o caso da cocaína. Sua matéria prima, a filha de coca, é cultivada nos Andes, especialmente no Peru, Bolívia, Colômbia e Equador. No entanto, a produção da cocaína exige uma série de insumos químicos e nenhum destes países tem uma indústria química desenvolvida. O Brasil, por sua vez, possui a maior indústria química da América Latina”. Ou seja, nenhum dos países citados pode ser apontado, isoladamente, pela produção da cocaína. Essa “indústria” tem um caráter essencialmente transnacional.

Novas tendências das máfias transnacionais
Presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais, Wálter Maierovitch é um estudioso do assunto há muito tempo. O livro “Novas Tendências da Criminalidade Transnacional Mafiosa” (Editora Unesp), organizado por ele e por Alessandra Dino, professora da Universidade Estadual de Palermo, trata dessas ramificações internacionais do crime organizado. A primeira Convenção Mundial sobre Crime Organizado Transnacional, organizada pela ONU, em 2000, em Palermo, destacou o alto preço pago ao crime organizado internacional em termos de vidas humanas e também seus efeitos sobre as economias nacionais e sobre o sistema financeiro mundial, onde US$ 400 bilhões são movimentados anualmente.

Em 2009, diante da crise econômico-financeira mundial, o czar antidrogas da ONU, o italiano Antonio Costa, chamou a atenção para o fato de que foi o dinheiro sujo das drogas funcionou como uma salvaguarda do sistema interbancário internacional. “Os bancos não conseguem evitar que esse dinheiro circule, se é que querem isso”, observa Maierovitch. A questão da droga, acrescenta, é muito usada hoje para esconder interesses geopolíticos. Muitos países são fortemente dependentes da economia das drogas, como é o caso, por exemplo, de Myanmar (antiga Birmânia), apontado pela ONU como o segundo maior produtor de ópio do mundo (460 toneladas), e de Marrocos, maior produtor mundial de haxixe.

Tráfico de armas sem controle
Uma grave dificuldade adicional que os governos enfrentam para combater o narcotráfico é que ele anda de mãos dadas com o tráfico de armas. O Brasil é um dos maiores produtores de armas leves do mundo. Em 2009, a indústria bélica nacional atingiu o recorde do período, com a fabricação de 1,05 milhão de revólveres, pistolas e fuzis, segundo dados da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército. A falta de controle sobre a circulação de armas, observa Maierovitch, é um problema grave. Quando um carregamento com armas sai de um porto brasileiro, explica, exige-se um certificado de destinação. Mas, depois que o navio sai do porto, perde-se o controle. O certificado diz, por exemplo, que as armas vão para Angola. Mas quem garante que, de fato, foram para lá? Esse certificado serve para que, então? – indaga o jurista.

O quadro que vemos hoje no Rio, insiste Maierovitch, precisa ser amplificado para que possamos ver todas essas conexões com o crime organizado transnacional, que atua em rede com nós funcionando como pontos de abastecimento e distribuição. Essas redes são flexíveis e estão espalhadas pelo mundo, acessíveis a quem assim o desejar. Há várias portas de entrada para ela e identificar suas ramificações não é tarefa simples. O jurista cita o caso da cocaína. Cerca de 90% da cocaína consumida hoje nos Estados Unidos vem da Colômbia e entra no país pelo México. E 90% das armas utilizadas pelos cartéis mexicanos vêm dos Estados Unidos. Ou seja, há duas vias de tráfico na fronteira entre EUA e México: por uma circulam drogas e pela outra, armas.

Pacificação x Militarização
Neste cenário global de expansão e ramificação do crime organizado, Maierovitch considerou surpreendente e muito importante a recente ação policial no Rio de Janeiro, na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão. Essa ação, destaca, traz elementos importantes que devem marcar a ofensiva contra o crime: reconquista de território, retomada do controle social nas comunidades, garantir cidadania e liberdades públicas à população que vive nestas áreas. A política que vem sendo implementada pelo governo do Rio, acrescenta, está baseada num conceito de pacificação e não de militarização como ocorreu, por exemplo, no México, onde o governo de Felipe Calderón colocou o Exército na linha de frente da guerra contra o narcotráfico e está perdendo essa batalha, com um grande número de vítimas civis.

No Rio, prossegue, o que houve foi uma reação a ataques espetaculares cometidos pelo tráfico, mas a política é pacificadora. “No início do governo de Sérgio Cabral fui um crítico à política que ele estava implementada e que seguia essa linha adotada no México. Mas agora a política é outra e merece apoio. Maierovitch critica o que chama de “ataques diversionistas” contra o governo estadual, que o acusam de favorecer as milícias ao focar sua ofensiva no Comando Vermelho e no Amigos dos Amigos. “Esse diversionismo só favorece o crime organizado. Há territórios que estão sendo retomados e rotas de tráfico interrompidas. É possível e fundamental reestabelecer a cidadania no Rio de Janeiro”, defende.

Trata-se, em resumo, de uma luta permanente, global e em várias frentes, onde cada metro de terreno conquistado deve ser valorizado e cada derrota imposta ao crime organizado servir como aprendizado para maiores vitórias no futuro. Maierovitch conclui: “A Itália é a terra da máfia, é verdade, mas também se tornou a terra da luta contra a máfia. Precisamos aprender com essas experiências.”

FONTE: http://cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17236

sábado, 27 de novembro de 2010

O espetáculo do Desastre








Fica nisso mesmo
Absurdo por absurdo
Vídeo pra cego, som pra surdo
Ninguém tá entendendo nada
Eu vejo tudo às claras com a luz apagada
Subsolo

Estamos vendo tudo. Até mesmo as sombras daquilo que não deveria ser visto. As sombras que o poder lança sobre aquilo que não se deseja mostrar, ou melhor, naquilo que não pode aparecer como condição necessária para a própria sustentação destas relações, no mais das vezes, desastrosas para a vida.
Toda a ação policialesca que vem efetivando-se no Rio de Janeiro nos últimos dias, dos tanques de guerra ao policial armado, envolvem um processo de atualização nas formas de gerir o poder sobre o tráfico, mas também de gestar a vida das pessoas que vivem nas favelas, reorganizando assim todo um complexo inventário de submissão e  medo, problemas que evidentemente se alargam para toda a sociedade. Pretendo ser breve, por isso talvez as palavras venham gaguejantes. Toda essa violência desmedida e arquitetada funcionam para desmanchar antigas formas de organizar o tráfico nas favelas em nome da novidade, da boa nova do poder, representado pela ação miliciana, pelas UPP´s, por uma burocratização do tráfico, que agora passa a ser literalmente "assunto de polícia" Tornou-se interessante, digo rentável, um maior controle sobre o tráfico e na perspectiva das milícias, sobre a cotidianidade das favelas. Pretende-se agora, exercer um controle mais amplo nesses espaços que antes eram "negligenciados" pelo Estado- as aspas servem para dizer que até bem pouco tempo era a imagem da negligência que enquadrava as fotos tiradas das favelas- mas o quadro mudou, a foto rende mais se o titulo mudar para "controlados", ou se quiser, "pacificados". Estamos presenciando um processo que é de atualização, ou seja, novas estratégias estão sendo utilizadas para tratar a questão do tráfico, do mercado que ele engloba, das favelas, da segurança, e por fim, da violência. A trama que aglutinava as antigas formas de lidar com tais questões estão sendo, pouco a pouco, dissolvidas, em nome de outras. Mas isso são sombras, não querem nos deixar ver a escuridão, que na verdade é o que interessa, preferem nos entorpecer com as luzes da mídia, do espetáculo midiático, que transmite ao vivo todo esse desastre.
Pois para a mídia a questão é outra: a luta que se trava é entre o "Bem" e o "mal", que na perspectiva da mídia sabemos quem são. Há tanto tempo Nietzsche já dizia "para além do bem e do mal". Mas não adianta, o espetáculo fundado pela imprensa costuma noticiar todo esse caos regado a bala de fuzil como sendo uma luta entre opostos, entre aqueles que para além de serem bons ou maus, querem, desejam, tem vontade de FAZER o bem ou o mal. Ora, isso apenas evidencia o real comprometimento da mídia: ser uma máquina capaz de acelerar as mudanças citadas anteriormente. Nessa sociedade em que vivemos, midiocrática, são os telejornais e plantões ao vivo que realmente funcionam, pois estes servem para dar velocidade e legitimidade as práticas criminosas que vem acontecendo no Rio de Janeiro. A imprensa não noticia, ela estimula por meio de ondas de sons e imagens as novas perspectivas que estão sendo almejadas pelo poder. A mídia vem ajudando a desenhar o novo diagrama de poder do Rio de Janeiro. As emissoras de televisão, de rádio, os sites de notícia, estão fazendo do desastre que se tornou a vida nas favelas um grande espetáculo entre "heróis sem férias" e "bandidos desesperados". Mas acreditem, isso é apenas sombra. O que se deseja é uma nova composição organizacional do tráfico de drogas, o que se deseja é ter um maior controle deste grande cafetão da nossa sociedade, o mercado. E isso, a mídia não fala.
A cada dia, os poderes públicos vem "legalizando" o tráfico de drogas, por meio de atuações nefastas que dão outro funcionamento à organização do mercado, buscando mecanismos que façam com que isso se torne cada vez mais rentável para outros setores da sociedade, que não os traficantes- estes que eles combatem- é só uma troca, e quem paga são estas vidas desperdiçadas que se digladiam num conflito criado, como ficção mesmo, para instituir esse rearranjo organizacional, no qual o Rio de Janeiro está submerso . Entretanto, se torna muito mais rentável e politicamente correto velar esse contexto sob a égide da proibição e do moralismo sagaz desta tal guerra contra o "mal".  Manter o tráfico às escuras, nas sombras,em pleno funcionamento, em nome do dinheiro, na mão de "bons" traficantes. Proibi-lo e combatê-lo às claras, com a ajuda da mídia, claro, em nome da moral de uma sociedade que quanto mais se desenvolve economicamente, mais reacionária se torna, caminho natural de quem prefere viver ofuscado pela luz da produção e do consumo, mais isso são outras questões. Para ser mais claro, o caso que estamos vendo acontecer no Rio de Janeiro nos mostra até que ponto a briga por territorialidades lucrativas podem chegar, essa guerra não é contra o terror, seja lá o lado em que este está. Não se trata disso, esse é apenas o pretexto legitimador, o que realmente incide tal conflito, o que faz o sangue correr por entre as vielas e se misturar com o esgoto, é uma guerra por dinheiro, em nome do dinheiro, do lucro (e para isso, exortando os pobres do direito à vida) que este novo diagrama de poder vem estabelecer nas favelas desta cidade maravilhosa.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O interessante jogo proibicionista: quem é vítima?


Analisando o processo de usuários que são detidos por posse de drogas para consumo pessoal percebe-se a existência de uma “vítima” neste trâmite jurídico denominada Estado.
Se pensarmos bem, a criminalização da maconha por parte desta suposta vítima denota uma tentativa de manter um quadro de delinqüência no país, além de sustentar um mercado paralelo considerado pelo âmbito jurídico ilegal de tráfico de drogas. Pensando na perspectiva do atual modelo econômico vigente, o capitalismo, essa forma mercantil é totalmente permitida, uma vez que atende ao principal interesse das nações que é o acúmulo incessante de capital através das trocas de substâncias entorpecentes, seja ela a cocaína, o crack, o ecstasy, LSD, ou a maconha.  

Esse jogo de trocas ilegais movimenta, segundo o Relatório Mundial sobre Drogas das Nações Unidas (2005), 13 bilhões de dólares, ao passo que no Brasil, em particular o estado do Rio de Janeiro, segundo o estudo da secretaria de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro "A Economia do Tráfico na Cidade do Rio de Janeiro: Uma Tentativa de Calcular o Valor do Negócio" (2008) estimou que o tráfico de drogas fatura entre 316 e 633 milhões de reais por ano.

A que ponto está querendo se chegar com estes dados? Que esta suposta vítima, o Estado brasileiro, lucra de forma incessante mantendo esta forma de transação comercial e, portanto, desinteressante do aspecto econômico a mudança legislativa em relação à legalização da maconha e, num âmbito maior, a descriminalização de outras drogas.
Para manter esta situação sob o controle das forças policialescas nacional,  os aparelhos ideológicos fazem a sociedade crer que o aumento do contingente repressor legitimado pelo Estado é a saída mais eficaz no combate ao tráfico de drogas, assim como a criação de maiores centros de detenção para delinqüentes que hoje atinge o exorbitante número de 290 mil usuários detidos no Brasil, e nos EUA esse número chega a 1 milhão.
O exercício sociológico que é inexistente neste projeto de guerra ao tráfico é que o número de usuários não diminuiu, o poder paralelo do tráfico de drogas só acresceu, juntamente com o tráfico de armas que impera em zonas latentes em que se dá estas transações comerciais, marginalizando socialmente as comunidades periféricas dos centros urbanos e inserindo novos atores neste jogo: crianças e adolescentes que estão excluídos das escolas e seus responsáveis que são afetados pela desestruturação do mundo do trabalho, assim como continua existindo a extorsão policial como prática da política proibicionista. Isto pode ser muito bem visto em cidades como o Rio de Janeiro (Brasil), Medellín e Cali (Colômbia), e Tijuana (México) para se visualizar como exemplos desse conflito.
Para sustentar essa política proibicionista vigente no Brasil, e na maioria de tantos outros países, fora investido trilhões de dólares de maneira irresponsável, irracional e incompetente, uma vez que esta se encontra completamente falha e falida, podendo ser associado a um holocausto de proporções semelhante à Alemanha em tempos de guerra mundial. Isto porque inclui a execução de moradores de periferia, negros e pobres, além da suspensão de muros cercando favelas como espécie de “proteção” a sociedade de classe média, branca e da zona sul.
Esta política, tão ambígua em sua efetivação, demonstra duas faces: uma delas a política de redução de danos, que é adotada em países que tentam amenizar a repressão de drogas e aos usuários e, ao mesmo tempo, ainda sustenta um lei proibicionista que, apesar de diferenciar o usuário do traficante e abrandar as penas, continua com uma postura militarizada para tratar do assunto. Daí surge a questão de formação da polícia, assim como uma radical mudança valorativa da sociedade que trata o assunto de maneira conservadora, moralista e hipócrita.
Nesse quadro de proibição das drogas, mais especificamente da criminalização da maconha, aparece um nó compreensível que se destina a entender o porquê do Brasil não ter aprovado a lei de reforma agrária. Diante disto, vê-se na região nordeste o chamado “Polígono da Maconha”, situado no estado de Pernambuco, que concentra latifúndios para plantação de maconha explorando a mão-de-obra campesina a preços ínfimos, deixando os trabalhadores sem poder recorrer ao ministério do trabalho em casos de maus tratos e/ou qualquer outro tipo de abuso existente, assim como a tentativa de destruir plantações de coca na Bolívia que é uma planta inserida dentro do contexto cultural da sociedade indígena como forma de aliviar fome e agüentar a altitude de determinadas cidades (não confundir a coca planta, com o processo químico que esta planta é submetida para a produção de cocaína).
Esta proibição que ocorre há 77 anos no Brasil deixa claro quem é vítima e quem é ator da agressão. Um Estado que executa, chacina, latrocina, estupra e prende não merece ser chamado de vítima, não merece ser chamado de protetor dos cidadãos brasileiros que querem fazer uso do seu próprio corpo, que mantém nos marcos legais do capitalismo uma prática imoral e imunda, subjugando toda uma sociedade a grupos de traficantes armados apontando fuzis na cabeça de uma suposta liberdade que nos é “gentilmente” concedida através da omissão do poder público frente a esta questão.
Portanto, aqueles que dizem que a marcha da maconha é um prática apologética e que reforça o poder do tráfico e do traficante, não é verdadeiro. Marcha da Maconha é uma irracionalidade estar acontecendo no sentido de que é igualmente irracional o Estado brasileiro manter a maconha proibida neste país, impedido pesquisas para o seu uso medicinal, não permitindo seu uso recreativo, legitimando o lucro abusivo da indústria farmacêutica, têxtil e do tráfico.