quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Legalização da maconha: não se, mas quando

Ethan Nadelmann
Tradução Coletivo DAR
Iniciativa de legalização da maconha na Califórnia, a Proposição 19 não conseguiu a maioria dos votos ontem mas ainda assim representa uma extraordinária vitória para ampliar o movimento pela legalização.

O que é mais importante é o modo como a mera presença da votação combinada com uma campanha de rua transformaram o diálogo público sobre maconha e políticas para ela. A cobertura da mídia sobre o assunto não só na Califórnia como ao redor do país e até internacionalmente foi excepcional, em quantidade e qualidade. Mais pessoas sabiam sobre a Proposição 19 do que sobre qualquer outra questão colocada nas cédulas deste ano – não só na Califórnia mas nacionalmente.

O debate está migrando de se a maconha deve ser legalizada para como deve ser. Pesquisas de opinião revelam que na maioria dos estados os cidadãos apoiam a legalização. Uma liderança da campanha “Não à 19” admitiu que até mesmo seus próprios apoiadores estavam divididos entre os opositores à legalização da maconha e aqueles que são a favor mas têm dúvidas quanto a questões específicas da Prop.19 ou quanto à ameaça do governo federal de bloquear a implementação dela.

A Proposição 19 elevou e legitimou o discurso público sobre maconha. É pequeno mas crescente o número de políticos eleitos que endossaram a 19 ou disseram que votariam por ela – e a também crescente e frequente expressão de apoio privado por candidatos e eleitos que disseram que gostariam poder ir à público sobre suas posições. Está aumentando o número de apoios por parte de sindicatos, inclusive SEIU Califórnia, e organizações de defesa de direitos civis, incluindo a seção californiana da NAACP e a National Latino Officers Association.

A atenção internacional, especialmente na América Latina, foi intensa. O presidente do México, Calderon, e o presidente Colombiano Juan Manuel Santos criticaram a 19, pontuando-a como uma evidência da inconsistência da política de drogas dos EUA. Mas a possibilidade dela ser aprovada fez com que ambos presidentes defendessem um debate mais aberto sobre a legalização e outras alternativa a atual política de drogas. Diplomatas mexicanos em público castigavam a Proposição 19 mas no âmbito privado diziam torcer por sua vitória. Ninguém pensou que a vitória da 19 poderia instantaneamente tirar os traficantes mexicanos do negócio, mas todos reconheceram que representaria um passo fundamental para a legalização da maconha definitiva nos dois lados da fronteira. E definitivamente iria minar as organizações criminais, que iriam perder sua vantagem comercial assim como o fim da proibição nacional ao álcool fez com os vendedores de bebidas.

Como seria ótimo se a Califórnia transformasse isso num exemplo”, disse o ex presidente mexicano Vicente Fox numa entrevista de rádio semana passada. “Tomara Deus que passe. Os outros estados dos EUA irão seguir esse passo”.

Existem agora sólidas e crescentes evidências de que a legalização da maconha é um problema com o qual os jovens se preocupam bastante – e colocando-a em votação aumentam as chances de que eles passem a votar. Os dois maiores partidos não tiveram escolha senão prestar atenção, especialmente quando a fidelidade política de seus jovens eleitores está sendo capturada. Os democratas corretamente observaram que o problema da maconha está lhes trazendo mais votos do que para os republicanos. Perguntado sobre o que iria mobilizar os jovens que elegeram Obama a votarem com os democratas novamente, o presidente do Partido Democrata na Califórnia, John Burton, respondeu com apenas uma palavra: maconha.

É notável ainda que Meg Whittman, a candidata republicana ao governo da Califórnia, não tenha atuado ativamente na campanha contra a 19, principalmente porque não queria se afastar de jovens eleitores que não se identificam com os democratas mas são convictos sobre legalizar a maconha. Jovens eleitores que estão num espectro político inclinado ao libertarismo, especialmente em questões como a maconha. Democratas e republicanos necessitarão repensar o problema quando Garu Johnson, ex governador do Novo México que já defendeu a legalização da maconha e a redução de danos para outras drogas, candidatar-se para as eleições primárias que elegerão o candidato a presidente pelo Partido Republicano como ele parece decidido a fazer. Jovens eleitores podem gravitar num número substantivo em direção a essa mensagem.

Para aqueles de nós engajados numa estratégia de longo prazo para a reforma da lei sobre maconha, o plano é o mesmo que seria se a 19 tivesse ganho: colocar a questão aos eleitores nos estados onde as sondagens mostram o apoio da maioria para legalizar, e introduzir leis semelhantes em assembleias estaduais. O apoio público para a legalização já atinge hoje a faixa dos 50% não só na Califórnia mas num crescente número de estados, incluindo Washington, Oregon, Alaska, Colorado e Nevada – então é razoável esperar que iniciativas eleitorais como a 19 aconteçam nestes estados nos próximos anos. É muito cedo para dizer se a questão vai voltar às urnas na Califórnia em 2012 mas ao menos sabemos que uma proposta de regulamentar e taxar a maconha será considerada pela câmara estadual, assim como uma foi neste ano. E diversas outras propostas similares podem ser esperadas ao redor do país, estimuladas pela Proposição 19 e rapidamente aumentando o apoio nacional pela legalização.

Enquanto isso, a 19 já pode reivindicar uma grande vitória: o governador Schwarzenegger recentemente assinou uma lei que reduz a penalidade para posse de maconha de uma contravenção para uma infração não passível de prisão, assim como uma multa de tráfego. Este não é um problema menor em um estado que prende anualmente por posse maconha um total de 61 mil pessoas – mais que o triplo do que o número de 1990. É largamente assumido que a principal razão para o governador assinar tal lei, proposta por um senador liberal, Mark Leno, foi minar uma das argumentações centrais em favor da 19.

Demográfica, econômica e moralmente apresenta-se um ambiente favorável à morte da proibição da maconha. Mais da metade dos eleitores californianos menores de cinquenta anos declarou que votaria pela Proposição 19, e assim o fez. Os eleitores mais jovens são os mais favoráveis enquanto os mais idosos os mais opositores. Enquanto isso, os argumentos econômicos para a legalização – incluindo diminuição de gastos com repressão e incrimento do orçamento através de impostos da maconha legal – só irão se tornar mais persuasivos. A maconha não se legalizará sozinha, mas o momento está próximo como nunca esteve, com estadunidenses de todo o espectro político pensando que é tempo de tirá-la do armário e da justiça criminal.

Ethan Nadelmann é fundador e diretor executivo da Drug Policy Alliance (www.drugpolicy.org )

FONTE: http://coletivodar.wordpress.com/2010/11/03/legalizacao-da-maconha-nao-se-mas-quando/

Nenhum comentário:

Postar um comentário